IMAGENS

IMAGENS
PLANETA VERDE

sexta-feira, 28 de outubro de 2011

http://www.polis.org.br/

COMO PREVENIR E ENFRENTAR AS ENCHENTES

As enchentes provocadas por fortes chuvas que atingem 13 estados já deixaram mais de 200 mil pessoas desalojadas, hospedadas com amigos e familiares, e cerca de 100 mil desabrigados, que dependem de abrigos públicos. O Especial Cidadania traz explicações sobre esse tipo de desastre natural e as recomendações da Secretaria Nacional de Defesa Civil sobre como prevenir e enfrentar as inundações.
PRINCIPAIS TIPOS E CAUSAS MAIS FREQUENTES
As enchentes que vêm ocorrendo no país podem ser classificadas em dois tipos, de acordo com a Secretaria Nacional de Defesa Civil (Sedec), órgão do Ministério da Integração Nacional.
1) Enchentes repentinas, bruscas e (ou) enxurradas:
Ocorrem em regiões de relevo acentuado e montanhoso e se caracterizam pelo acúmulo de grande quantidade de água num curto período. São frequentes em rios de zonas montanhosas e vales profundos. Muitas vezes as águas de chuva arrastam terra sem vegetação devido aos deslizamentos nas margens dos rios. Chuvas fortes ou moderadas, mas duradouras, também podem originar enchentes repentinas, quando o solo esgota sua capacidade de infiltração.
2) Enchentes em cidades ou alagamentos:
Águas se acumulam nas ruas e nos perímetros urbanos por fortes chuvas em cidades com sistema de drenagem deficiente. O fenômeno está relacionado à redução da infiltração natural nos solos urbanos, provocada por:
Compactação e impermeabilização do solo;
Pavimentação de ruas e construção de calçadas;
Adensamento de edificações, que contribuem para reduzir o solo exposto e concentrar o escoamento das águas;
Desmatamento de encostas e assoreamento dos rios;
Acúmulo de detritos em galerias pluviais, canais de drenagem e cursos d’água.
O coordenador do Centro de Apoio Científico em Desastres (Cenacid) da Universidade Federal do Paraná, Renato Lima, alerta para os resíduos de construção depositados nos rios em algumas cidades. Essa é uma prática que provoca enchentes, pois, assim como o lixo nas tubulações, os resíduos reduzem a vazão do volume de água. "É uma conduta inadequada da população, que acaba se tornando vítima", afirma o especialista.
O QUE FAZER SE O RISCO DE ALAGAMENTO FOR IMINENTE
Não deixe crianças em casa sozinhas.
Mantenha sempre prontos água potável, roupa e remédios, caso tenha que sair rápido de casa.
Avise vizinhos, corpo de bombeiros e a Defesa Civil sobre o perigo, no caso de casas construídas em áreas de risco e em áreas afetadas pela enchente.
Convença as pessoas que moram em áreas de risco a saírem de casa durante as chuvas.
Coloque documentos e objetos de valor em um saco plástico bem fechado e em local protegido.
Salve e proteja, antes de tudo, sua vida, a de seus familiares e amigos.
Tenha um lugar previsto e seguro, onde você e sua família possam se alojar.
Desconecte os aparelhos elétricos das tomadas e não utilize eletrodomésticos que tenham sido molhados: há risco de choque elétrico.
Feche o registro de água.
Não deixe crianças brincando na enxurrada ou nas águas dos córregos: elas podem ser levadas pela correnteza ou contrair doenças como hepatite e leptospirose.
PROVIDÊNCIAS A TOMAR DEPOIS DA CALAMIDADE
Enterre animais mortos e limpe escombros e lama.
Lave e desinfete objetos que tiveram contato com as águas da enchente.
Retire todo o lixo da casa e do quintal e o coloque para a limpeza pública.
Certifique-se de que seu imóvel não tem risco de desabamento.
Ao movimentar objetos, móveis e utensílios, tenha cuidado com aranhas, cobras e ratos.
Nunca beba água de enchente ou coma alimentos que estavam em contato com essa água.
CUIDADOS NECESSÁRIOS COM A ÁGUA
Água para consumo humano
Pode ser fervida ou tratada com água sanitária, na proporção de duas gotas para um litro de água, ou tratada com hipoclorito de sódio, na proporção de uma gota para um litro de água. Nos dois casos, deixar em repouso por 30 minutos para desinfetar.
Água para limpeza e desinfecção
Deve ter um litro de hipoclorito de sódio para 20 litros de água ou um litro de água sanitária para cinco litros de água.3607
OBRIGAÇÕES DO PODER PÚBLICO E PARTICIPAÇÃO DA COMUNIDADE
Prevenção é a palavra-chave quando o assunto é enchente, pois grande parte dos recursos para cobrir prejuízos é pública, ou seja, vem dos impostos pagos pela população. As ações da Defesa Civil têm recursos previstos no Orçamento da União e nos dos estados e municípios.
O Fundo Especial para Calamidades Públicas (Funcap) é outro instrumento financeiro de resposta aos desastres. A Sedec recomenda que fundos estaduais e municipais semelhantes sejam instituídos.
A política nacional de defesa civil prevê – por meio do Sistema Nacional de Defesa Civil (Sindec), composto de órgãos federais, estaduais e municipais – a recuperação socioeconômica de áreas afetadas por desastres. Entre as ações, está a recolocação populacional e a construção de moradias para populações de baixa renda. O Sindec deve fornecer cestas básicas de materiais de construção. Cabe à comunidade participar do mutirão de obras. O poder público é responsável também pela recuperação da infraestrutura de serviços públicos e dos ecossistemas.
Dois órgãos são essenciais nas ações de prevenção a enchentes em um município. A coordenadoria municipal de defesa civil (Comdec) é responsável pela execução, coordenação e mobilização de todas as ações de defesa civil no município. Sua principal atribuição é conhecer e identificar os riscos de desastres no município, preparando a população para enfrentá-los com a elaboração de planos específicos. Cabe ao prefeito determinar a criação de uma Comdec, mas a iniciativa pode partir das autoridades locais ou dos cidadãos.

Também é necessária a participação da comunidade nas atividades de defesa civil por meio dos núcleos comunitários de defesa civil (Nudecs), grupos comunitários que trabalham de forma voluntária. A instalação dos Nudecs é prioritária em áreas de risco e preparam a comunidade local a dar pronta resposta aos desastres.3608
O QUE A PREFEITURA PRECISA FAZER PARA EVITAR AS INUNDAÇÕES
Elaborar o plano diretor de desenvolvimento municipal, identificando áreas de risco e estabelecendo regras de assentamento da população. Pela Constituição, esse plano é obrigatório para municípios com mais de 20 mil habitantes.
Fiscalizar as áreas de risco, evitando o assentamento perigoso.
Aplicar multas, quando o morador não atender às recomendações.
Elaborar plano de evacuação com sistema de alarme. Todo morador deve saber o que e como fazer para não ser atingido.
Indicar que áreas são seguras para construção, com base no zoneamento.
MEDIDAS DE PREVENÇÃO QUE DEPENDEM DE TODO CIDADÃO
Não jogue lixo em terrenos baldios ou na rua.
Não jogue sedimentos, troncos, móveis, materiais e lixo nos rios, pois afetam o curso desses.
Ao realizar uma obra, certifique-se de que os resíduos serão depositados em locais adequados.
Não jogue lixo nos bueiros.
Limpe o telhado e as canaletas de água.
Não construa próximo a córregos.
Não construa em cima ou embaixo de barrancos.
O QUE É?
Situação de emergência Reconhecimento legal pelo poder público de situação anormal provocada por desastres, causando danos suportáveis e superáveis pela comunidade afetada.
Estado de calamidade pública Reconhecimento legal pelo poder público de situação anormal provocada por desastres, causando sérios danos à comunidade afetada, inclusive à vida de seus integrantes.
*Ambas as declarações são feitas por decreto pelo governador do Distrito Federal ou prefeito municipal.
Fonte: www.senado.gov.br

ENCHENTES - VAMOS REFLETIR E COLABORAR

Todos os anos é a mesma coisa na época das chuvas de verão. As regiões metropolitanas das grandes cidades enfrentam as enchentes que desabrigam milhares de pessoas, além de ferir e até matar outras tantas. Normalmente os maiores prejudicados são as pessoas pobres da periferia que não possuem condições seguras e ideais de moradia, estando a mercê das precárias condições urbanísticas da cidade.
As enchentes são calamidades naturais ou não que ocorrem quando um leito natural recebe um volume de água superior ao que pode comportar resultando em transbordamentos. Pode ocorrer em lagos, rios, córregos, mares e oceanos devido a chuvas fortes e contínuas. São consideradas, entre as catástrofes naturais, as que mais danos causam à saúde da população e ao patrimônio, com elevada morbimortalidade, em decorrência do efeito direto das inundações e das doenças infecciosas secundárias aos transtornos nos sistemas de água e saneamento.
Com a chegada da estação das chuvas, cresce a preocupação sobre o aparecimento de doenças, sobretudo as transmitidas por água, alimentos, vetores, reservatórios
e animais peçonhentos. Este fato gera a necessidade de intensificação das ações de vigilância em saúde de forma oportuna, coordenada e articulada com outros setores e com base em dados para a tomada de decisões.
As enchentes, nos dias de hoje, são resultado de um longo processo de modificação e desestabilização da natureza por forças humanas, que acompanha o crescimento rápido e não planejado da maior parte das cidades.
Antigamente, as várzeas (margens dos rios) faziam o controle natural da água. O solo ribeirinho era preparado para ser inundado nas épocas de cheia, absorvia boa parte da água que transbordava e utilizava seus nutrientes. Hoje, quase todas as várzeas nas áreas urbanas se encontram ocupadas. Também uma imensa área às margens dos rios foi impermeabilizada pelo concreto, o que aumenta o volume de água a ser escoado.
Em áreas rurais ocorre com menos freqüência, pois o solo bem como a vegetação se compromete a fazer a evacuação da água pela sucção da mesma provocando menores prejuízos. Normalmente ocorre com menos força não atingindo consideráveis alturas que provocariam a perda de alimentos armazenados, de máquinas e outros objetos. Já nas áreas urbanas, ocorre com maior freqüência e força trazendo grandes prejuízos. Acontece pela interferência humana deixando assim de ser uma calamidade natural. A interferência humana ocorre em vários estágios começando pela fundação de cidades em limites de rios, pelas alterações realizadas em bacias hidrográficas, pelas construções mal projetadas de diques, bueiros e outros responsáveis pela evacuação das águas e ainda pelo depósito errôneo de lixo em vias públicas que, com a força das águas, são arrastados causando o entupimento dos locais de escoamento de água (bueiros e galerias).

Principais causas das enchentes:
Alto índice pluviométrico da região
Desmatamento
Assoreamento do leito dos rios
Retificação dos rios. Na natureza, os rios com considerável volume de água são curvilíneos, ou seja, caminham como uma serpente. Esse trajeto diminui de forma considerável a velocidade da água. Retificá-lo significa aumentar sua velocidade, o que agrava a situação nos pontos de estrangulamento (conversão de águas)
Alto grau de impermeabilização do solo pela malha asfáltica e de concreto
Ocupação desordenada e crescimento populacional de migrantes
Alto grau de pobreza da periferia da cidade, o que impossibilita as pessoas terem recursos para destinar o lixo, por exemplo
Falta de consciência e educação ambiental dos administradores e da população em geral
Omissão do Poder Público na gestão urbana e falta de saneamento básico adequado.
As enchentes, na maioria das vezes, ocorrem como conseqüência da ação humana.

Das dificuldades que uma enchente provoca podemos destacar:
Perda de vidas
Abandono dos lares inundados
Perda de materiais, objetos e móveis encharcados ou arrastados pelas águas
Contaminação da água por produtos tóxicos
Contaminação da água com agentes patológicos que provocam doenças como amebíase, cólera, febre amarela, hepatite A, malária, poliomielite, salmonelose, teníase, leptospirose, entre outras
Contaminação de alimentos pelos mesmos agentes patológicos acima citados
Interrupção da atividade econômica das áreas inundadas.
As áreas urbanas são mais propícias a enchentes porque o solo dessas regiões são impedidos pelo asfalto e outros tipos de pavimentações de absorverem a água e também pela falta de vegetação ou pouca vegetação que contribui com a absorção da água.
Podemos destacar as duas principais formas de inundações:
Inundações de áreas ribeirinhas
Os rios geralmente possuem dois leitos, o leito menor onde a água escoa na maioria do tempo e o leito maior, que é inundado em média a cada 2 anos. O impacto devido à inundação ocorre quando a população ocupa o leito maior do rio, ficando sujeita às enchentes;
Inundações devido à urbanização
As enchentes aumentam a sua freqüência e magnitude devido à ocupação do solo com superfícies impermeáveis e rede de condutos de escoamentos. O desenvolvimento urbano pode também produzir obstruções ao escoamento como aterros e pontes, drenagens inadequadas e obstruções ao escoamento junto a condutos e assoreamentos. Ocorrem, principalmente, pelo processo natural no qual o rio ocupa o seu leito maior, de acordo com os eventos chuvosos extremos, em média com tempo de retorno superior a dois anos (ultimamente este tempo tem diminuído). Normalmente ocorre em grandes bacias (> 500 km2), sendo decorrência de processo natural do ciclo hidrológico. Os impactos sobre a população são causados, principalmente, pela ocupação inadequada do espaço urbano. Essas condições ocorrem, em geral, devido às seguintes ações: como, a existência de loteamentos em áreas de risco de inundação; invasão de áreas ribeirinhas principalmente pela população de baixa renda; ocupação de áreas de médio risco, que são atingidas com freqüência menor, mas que quando o são, sofrem prejuízos significativos.
Para impedir ou diminuir os efeitos das enchentes e que inúmeras famílias percam seus patrimônios, pode-se construir barragens e reservatórios em áreas de maior risco, bueiros, diques e piscinões espalhados pela cidade com sua abertura protegida para impedir a entrada de resíduos sólidos, além de se promover a conscientização da população para que não deposite lixo nas vias públicas e leitos de rios, lagos e represas. Outras ações também são importantes para se minimizar os efeitos das enchentes, entre elas a regulamentação e fiscalização por meio do poder público do uso do solo, limitando a ocupação de áreas inundáveis a usos que não impeçam o armazenamento natural da água pelo solo e que sofram pequenos danos em caso de inundação. Esse zoneamento pode ser utilizado para promover usos produtivos e menos sujeitos a danos, permitindo a manutenção de áreas de uso social, como áreas livres no centro das cidades, reflorestamento, e certos tipos de uso recreacional.
Resumindo, para minimizar o problema:
Manutenção das áreas verdes existentes e preservação das áreas de preservação permanente
Criação de novas áreas verdes para aumentar a permeabilização
Construir represas, diques e piscinões, substituindo uma das funções das antigas várzeas, que é aliviar o quadro de inundações nos picos de cheia. Essas estruturas captam a água que ficaria empoçada na cidade, despejando-a pouco a pouco nos rios
Assistir a grande massa de pobres da periferia, melhorando o saneamento básico e garantindo a coleta de resíduos sólidos
Implementar programa de limpeza intensiva de bueiros e galerias entupidos com lixo jogado pela própria população
Estimular a educação ambiental nos órgãos públicos, entidades particulares e escolas
Estreitar o relacionamento entre o Poder Público e as associações de bairro
Levantar e definir os locais problemáticos em termos de enchentes e criar mecanismos técnicos mais eficazes para a vazão da água
Elaborar o Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano e o Plano Diretor de Drenagem Urbana, estabelecendo os índices de ocupação do solo e os parâmetros para a macrodrenagem urbana
Elaborar e implementar plano de contingência e programa de combate a inundações
Impedir o acesso de carros e pessoas nos locais críticos nos momentos de grandes precipitações pluviométricas
Manter o Poder Público em sintonia com o serviço de meteorologia.Fonte: www.vivaterra.org.br

sábado, 22 de outubro de 2011

VIDA E SAÚDE

Vida e Saúde são inseparáveis

É intuitivamente óbvio que Vida e Saúde são inseparáveis. O que interessa à Saúde deve fazer parte de qualquer conceituação de Qualidade de Vida. Principalmente para os idosos. Saúde é uma dimensão muito importante para a qualidade de vida dos idosos. Ter boa saúde é um fator determinante de boa qualidade de vida para os mais velhos. A longevidade trouxe alterações nos padrões de saúde de todos os países, com aumento da prevalência das condições crônicas, mudando, assim, o perfil de morbi-mortalidade. Nessa situação de prevalência aumentada de doenças crônicas, o principal objetivo das condutas e políticas de saúde não é mais a cura e, sim, a manutenção de boa qualidade de vida. Nos dias de hoje, os resultados das condutas e tratamentos devem ser avaliados através de variáveis subjetivas, que incorporem as percepções dos indivíduos em relação a seu bem-estar (Alleyne GAO, 2001).

Assim, a longevidade trouxe uma preocupação crescente entre os profissionais de saúde, bem como entre os leigos, de que o objetivo último da medicina e do cuidado em saúde não pode ser, simplesmente, a cura da doença e a prevenção da morte (Nordenfelt, 1994). Vários fatores têm contribuído para essa preocupação. Um muito importante é o progresso tecnológico da medicina. Muitas vezes, a tecnologia usada em Unidades de Terapia Intensiva tem possibilitado salvar, ou, pelo menos, prolongar inúmeras vidas, que, antes, sem tal tecnologia, chegariam ao fim. Mas, a vida que tem sido prolongada pode, em muitos casos, ser uma vida com muita dor e incapacidade, ou uma vida destituída de dignidade (Nordenfelt, 1994).

Devemos perguntar-nos: precisamos manter a vida a qualquer custo? “Os pacientes querem viver, não meramente sobreviver” (McDowell; Newell, 1996). A tecnologia é desejada e desejável e tem o seu lugar; quão importante tem sido, para melhorar a vida de tantos doentes. Mas, naquelas pessoas que estão vivendo o que pode ser considerado os seus últimos dias, o uso de tecnologia sofisticada, mantenedora da vida, muitas vezes coloca em risco a manutenção de uma boa qualidade de vida. Temos de garantir a boa qualidade de nossa morte.

Prover cuidado de máxima tecnologia, não significa assegurar uma vida com boa qualidade, em muitos casos. É preciso levar dignidade aos dias finais. Mais que viver a mais, as pessoas precisam e desejam ser cercadas de carinho e atenção, precisam e desejam ser amadas, precisam e desejam ser respeitadas quanto à sua autonomia e sofrer o menos possível, pois a vida tem de ser digna.

Não podemos esquecer-nos que saúde é apenas um dos aspectos da vida. Mesmo quando a integridade corporal está comprometida, a vida pode ser de ótima qualidade. Todos encontramos indivíduos que nos surpreendem com sua satisfação e alegria de viver, sua serenidade, seu senso de controle pessoal, seu estado de espírito, sua vontade de viver, sua competência comportamental, sua auto-estima, sua inserção familiar e social, sua maneira de encarar a vida, o sentido que deram às suas vidas, o significado que suas vidas representam para os outros e que, por outro lado, não estão íntegros do ponto de vista corporal (Alleyne GAO, 2001).

Mais importante, qualidade de vida se relaciona ao significado que a vida de alguém tem para os outros; uma vida de boa qualidade pode ser aquela em que há benefício para os demais. O “fazer o bem aos outros”, despretenciosamente, sem segundas intenções, melhora a vida do benfeitor, dá sentido à sua vida.

Para muitos, para ser possuidor de boa qualidade de vida, há necessidade de também possuir muitos bens materiais; quanto mais posse, melhor a qualidade de vida. É evidente que os bens materiais têm importância. Existe um patamar material mínimo, para se falar em boa qualidade de vida: seria a satisfação das necessidades mais elementares da vida humana. Alimentação, moradia, trabalho, educação, transporte, saúde, lazer, acesso a água potável, saneamento básico, respeito e dignidade são necessidades elementares. Para cada uma destas, há um nível minimamente aceitável. Abaixo dele, temos exclusão social; acima dele, cidadania.

A sociedade tem de garantir a todos os seus cidadãos um nível mínimo de vida, um padrão de vida dentro do patamar de inclusão. Amartya Sen faz-nos refletir sobre o desenvolvimento e bem-estar humanos (Crocker D, 1993): “Os bens materiais são valiosos, quando contribuem para o desenvolvimento humano; são eticamente básicos para o bem-estar e um bom padrão de vida dos seres humanos. O desenvolvimento humano não ocorre sem prosperidade material. As pessoas sequer podem ser, para não falar em ter uma boa vida ou bem-estar, se não dispõem de certos bens.

As pessoas podem sofrer de graves privações e, mesmo assim, serem cheias de alegria. Se não esperam muito da vida, podem ter enorme contentamento com quaisquer pequenas mercês que surjam para elas”. O pior é que “os muito pobres ajustam suas aspirações e desejos ao pouco que é possível”. Um prato de comida para aquele que está morrendo de fome é a melhor coisa que poderia acontecer para sua vida naquele momento. Mas, isto é boa qualidade de vida? Esmolas melhoram a vida de quem? “É evidente que pessoas abaixo dos patamares minimamente aceitáveis de inclusão social, carentes do mínimo necessário para a sobrevivência, dificilmente poderão atingir graus satisfatórios de bem-estar.” Não é impossível, mas, extremamente difícil.

Avaliações de qualidade de vida vêm sendo incorporadas às práticas do setor Saúde cada vez mais. Nos últimos trinta anos, Qualidade de Vida tem emergido como um atributo importante da investigação clínica e da formulação de políticas de saúde. Exemplo disto é a expansão de seu uso em ensaios clínicos e na avaliação do impacto das políticas implementadas. Qualidade de vida tem sido usada, para distinguir diferentes pacientes ou grupos de pacientes e avaliar intervenções terapêuticas.

Tradicionalmente, o atendimento médico era focalizado no diagnóstico e tratamento e o resultado era medido através de indicadores objetivos: morbidade e mortalidade. Nessas últimas décadas, este enfoque tem mudado e o resultado das condutas médicas tem sido avaliado, também, através de variáveis subjetivas, que incorporam as percepções dos pacientes em relação ao seu bem-estar e à sua qualidade de vida. Fala-se de vida e de qualidade! O dono da vida deve ter participação ativa na avaliação do que é melhor e mais significativo para ele; o dono da vida é quem define o padrão de qualidade.

Como o envelhecimento é uma experiência heterogênea, cada indivíduo pautará sua vida de acordo com padrões, normas, expectativas, desejos, valores e princípios diferentes. Há, assim, necessidade de instrumentos multidimensionais, sensíveis à grande variabilidade dessa população. Esses instrumentos devem considerar as especificidades dessa faixa etária, pois que, em virtude de seus valores e experiências de vida, os idosos diferem dos mais jovens. Além disso, fatores relacionados à idade afetam a saúde, dimensão importantíssima para a qualidade de vida na velhice. É também nessa fase da vida que ocorrem diversas situações sociais (aposentadoria, viuvez, dependência, perda de autonomia e de papéis sociais, diminuição da rede social de apoio e outras mais), colocando obstáculos a uma vida de melhor qualidade. Todos são fatores que aumentam a complexidade da mensuração da qualidade de vida das pessoas idosas (Paschoal, 2002).

Importância de se avaliar qualidade de vida na população idosa

“Sem dentes, sem visão, sem paladar, sem nada.”
(As you like it, Act II, Sc.2 - Shakespeare)

Fallowfield (1990), em sua importante revisão sobre qualidade de vida, cita Shakespeare, para mostrar a importância de se estudar a qualidade de vida de idosos. Apesar do quadro desanimador, através do qual o dramaturgo inglês descreve a velhice, a situação pode ser ainda pior, pois Shakespeare se deteve, apenas, na deterioração física. Fallowfield diz: “Para muitos idosos poderíamos também acrescentar: sem auto-estima, sem eficácia pessoal, sem amor, sem companhia, sem suporte social...Todos, mesmo os mais independentes, precisamos de afeto, de sermos amados, cuidados, estimados e valorizados e de termos a sensação de estarmos ligados a uma rede de comunicação e de obrigações mútuas. Sem estes suportes, muitos idosos experimentam impotência psicológica, levando a um estado de abandono e desesperança...”.

Portanto, se o estudo e a avaliação da Qualidade de Vida têm mostrado sua importância em vários segmentos e disciplinas, eles se revelam também importantes para a população idosa.

Grimley-Evans (1992), afirmando que o objetivo principal da vida humana é a busca da felicidade, argumenta que “saúde é valiosa à medida que promove felicidade; longevidade é valiosa à medida que oferece oportunidades continuadas para a felicidade”. Ele quer introduzir-nos na preocupação de transformar a sobrevida aumentada do ser humano numa etapa significativa da vida. Mas, apesar do consenso de que qualidade de vida é uma medida de resultado bastante adequada para pessoas idosas e da suposição de que elas estão mais interessadas na qualidade que no tamanho da sobrevida, ele discorda. Para ele, “essa hipótese pode ser, parcialmente, uma projeção inadequada das idéias de pessoas mais jovens, prestes a envelhecer”. Ele está preocupado com a aplicação, pura e simples, em idosos, de questionários elaborados para a população geral.

Diz mais: “algumas características da velhice tornam os idosos particularmente suscetíveis a perigos do uso acrítico de medidas de qualidade de vida”. Cita ele a perda da adaptabilidade biológica associada ao envelhecimento, com redução das reservas fisiológicas de todos os órgãos e sistemas, o que muda a capacidade de manter a homeostasia do meio interno, diferentemente do que ocorre com os jovens. Há, também, redução da adaptabilidade social, ocasionada pela aposentadoria e perda de poder aquisitivo, além do isolamento social devido à perda de familiares e amigos, reduzindo o suporte social.

Existe um desnível cultural entre jovens e velhos nas sociedades contemporâneas em constante transformação, em que os juízos e valores dos jovens podem ser estranhos aos idosos, nascidos e criados em outro contexto cultural e tecnológico; assim, os mais velhos podem não se familiarizar com conceitos e situações que os jovens enfrentam sem dificuldade.

Além disto, as sociedades ocidentais incorporaram vários preconceitos, que dificultam a vida dos idosos, como estes: a) os valores dos idosos são, necessariamente, antiquados e, dessa forma, são inferiores; b) os idosos são menos habilidosos, para fazer julgamentos e críticas; c) têm menor valor que os jovens e, por isso, precisam de menor atenção; d) a capacidade de desfrutar dos prazeres da vida diminui inevitavelmente à medida que se envelhece. O pior, continua ele, é que os próprios idosos incorporam alguns desses preconceitos e podem, muito facilmente, se subvalorizar, ou cair naquilo que eles acreditam que se espera deles. Outra característica é a enorme variabilidade do processo de envelhecimento, o que torna a heterogeneidade dos idosos maior que a dos jovens; por causa disto, para a população mais velha, haverá maiores injustiças e manuseio inapropriado, se a escolha dos cuidados se basear na média. Por fim, em razão das características citadas, os idosos são mais suscetíveis a influências ambientais imediatas (guerras, catástrofes, migração etc.).

Em seguida, Grimley-Evans levanta alguns problemas na aplicação de questionários existentes para avaliação da qualidade de vida de pessoas dessa faixa etária. Diz que se deve suspeitar de que os idosos terão mais dificuldade de trabalhar conceitos de probabilidade, ao tomar decisões, diferentemente dos jovens. Discute se isto é efeito do envelhecimento ou é efeito de coorte. De qualquer forma, pode dificultar na hora de se aplicar um questionário. Cita o trabalho de O’Connor (1989) que mostra que idosos tendem a inventar nas respostas a questionários e entrevistas, mais que jovens. Critica o uso de medidas que foram validadas em estudos de prevalência e são aplicadas em estudos de intervenção. Alerta para a tendência bem conhecida, por parte dos idosos, de avaliação otimista de seu estado de saúde e de seu bem-estar.

Levanta a dúvida do direito do pesquisador ou profissional de saúde de intervir, para melhorar uma situação, por saberem que pode ser melhorada, apesar dos idosos relatarem satisfação com aquela mesma situação. Pergunta, sem oferecer resposta: “se eles estão contentes com um estado funcional mais precário e são mais dependentes do que poderiam ser, os profissionais e todas as demais pessoas têm a obrigação de cooperar para uma melhora, que julgam ser possível?”. Termina dizendo do perigo de se chegar a uma desilusão com os instrumentos de medida inadequadamente avaliados, o que levará ao descrédito da abordagem como um todo.

Em outro estudo, Williams (1996) tece considerações semelhantes às de Grimley-Evans. Diz: “fatores, que parecem ser opcionais nos primeiros anos de vida, tornam-se críticos, na velhice, para manutenção da integridade, independência e autonomia de uma pessoa; é como se fosse uma questão de vida ou morte”. Passa a comentar alguns deles. Primeiro, diz que existem grandes diferenças individuais entre os idosos, mais que em qualquer outro grupo etário; são diferenças em quase todos os tipos de características, as físicas, mentais, psicológicas, condições de saúde e sócio-econômicas, o que torna as conclusões a respeito da qualidade da vida e do cuidado necessário altamente individualizadas.

Esse envelhecimento heterogêneo leva a duas situações-limite. Muitos idosos podem permanecer bastante saudáveis e com boa habilidade funcional até anos tardios, podendo manter estáveis suas características físicas, mentais, de personalidade e sociais; se há hábitos e estilos de vida saudáveis e na ausência de uma doença importante, haverá adaptabilidade e reserva funcional suficientes para a maioria das atividades. Por outro lado, os idosos podem adquirir incapacidades em qualquer dos domínios citados (físico, mental, psicológico, condições de saúde e sócio-econômico) e isto pode não ser passível de recuperação; as condições crônico-degenerativas, progressivamente mais prevalentes, vão levando a incapacidades, minando as reservas funcionais e levando à deterioração funcional; é verdade que adaptações podem se feitas (terapia ocupacional, p. ex.), modificações do meio-ambiente também (acessibilidade, p. ex.), além de reabilitação e uso de próteses e órteses, restaurando e compensando as perdas funcionais.

Podem continuar ativos em seu meio, contribuindo para o bem-estar de si, de sua família e da sociedade; não necessariamente se tornam um ônus, podendo assumir inúmeros papéis sociais na comunidade. Mas, podem necessitar do cuidado de outras pessoas, pois o envelhecimento funcional, inexorável e universal, aumenta a proporção, à medida que os anos passam, dos que necessitam de alguma ajuda, para desempenhar as atividades do dia-a-dia; o grau de dependência é muito variável, desde os que não precisam de nenhuma ajuda até os que são totalmente dependentes; na situação de dependência, o grande desafio é saber respeitar a individualidade e a autonomia da pessoa. É disso tudo que deriva a preocupação das pessoas idosas de terem como objetivo a manutenção de autonomia e do máximo de independência possível, em todos os domínios de sua vida.

Pelo menos em nosso país, estereótipos da velhice comprometem a possibilidade de uma qualidade de vida melhor. Em nosso meio, velhice está associada a perda, incapacidade, dependência, impotência, decrepitude, doença, desajuste social, baixos rendimentos, solidão, viuvez, cidadania de segunda classe e assim por diante; idoso é chato, rabujento, implicante, triste, demente, oneroso. Generaliza-se características de alguns idosos. Tal visão estereotipada, aliada à dificuldade de se distinguir entre envelhecimento normal e patológico, senescência e senilidade, leva à negação da velhice, ou à negligência de suas necessidades, vontades e desejos.

Ory; Cox (1994) também analisam na mesma direção, embora falando de uma sociedade mais desenvolvida como a norte-americana; afirmam que as pessoas idosas tendem a ignorar sintomas (tristeza, dor, cansaço), ou os sintomas são ignorados pelos profissionais de saúde. Mostra a nossa experiência que muitos profissionais tentam explicar os sintomas ou as queixas trazidos pelos idosos, como fazendo parte do processo natural do envelhecimento, o que leva a omissão e negligência, impedindo tratamento, reabilitação, adaptação, melhoria, cura (“isto é próprio da idade”).

Assim, os estereótipos, a confusão entre envelhecimento normal e patológico e a desatenção aos sintomas retardam ou impedem condutas e tratamentos, o que pode ter conseqüências negativas, para a vida e sua qualidade. Como exemplo, muitas idosas não se queixam de incontinência urinária, ou por vergonha, ou por acharem “normal” e se “acostumarem à urina solta”, apesar de incontinência ser causa de isolamento social e, secundariamente, de depressão. A própria depressão, extremamente prevalente entre os idosos e causa de grande sofrimento humano, é subtratada, ou, o que é pior, não diagnosticada, porque existe o preconceito de que “os idosos são um pouco tristes mesmo”.

Como procuramos demonstrar, características do envelhecimento e o contexto sócio-cultural tornam mais complicada a aferição da qualidade de vida dessa faixa etária. Fallowfield (1990), numa tentativa sintetizadora, mas que exemplifica bem essa complicação, diz que há muitos eventos vitais relacionados à idade, que provocam problemas psico-sociais; destes, “três concomitantes maiores da velhice afetam profundamente a qualidade de vida: deterioração física e mental, aposentadoria e luto”. Para Bowling (1995), aferir qualidade de vida é muito complexo e “os domínios que requerem medida entre os idosos incluem os problemas de saúde, que podem levar à incapacidade e invalidez, saúde mental, habilidade funcional, estado geral de saúde, satisfação de vida, estado de espírito, controle (autonomia) e suporte social”.

Isto mostra a enorme variedade de dimensões a serem aferidas numa avaliação de qualidade de vida de idosos. Portanto, há necessidade de instrumentos multidimensionais, que possam captar a enorme variabilidade dos diferentes grupos de idosos. Esses instrumentos devem considerar as especificidades dessa faixa etária, pois as populações idosas, em virtude de seus valores e experiências de vida, diferem dos grupos etários mais jovens; além disto, fatores relacionados à idade afetam a saúde, dimensão importantíssima para a qualidade de vida na velhice, e diversas situações sociais (aposentadoria, viuvez, dependência, perda de autonomia e de papéis sociais, dentre outras) colocam obstáculos a uma vida de melhor qualidade. Todos são fatores que aumentam a complexidade da mensuração da qualidade de vida das pessoas idosas., não podendo nos esquecer da advertência de Fletcher (1992), para quem o perigo é avaliar, apenas, “como o idoso se adapta a ser velho”.

Conceituar qualidade de vida não é tarefa das mais fáceis. Estimá-la, medi-la, compará-la, menos ainda. No entanto, devido à importância que hoje se atribui a ela, tanto para avaliação de resultados, condutas, tratamentos e políticas, quanto para avaliação de atendimento e serviços, um número muito grande de instrumentos de qualidade de vida está disponível, alguns gerais, que tentam analisar todas as dimensões da nossa vida, outros, específicos para determinados procedimentos ou patologias. Mas, poucos foram desenvolvidos tendo como alvo a população idosa. Quando há necessidade de se avaliar em idosos, aplicam-se, geralmente, instrumentos de uso universal, construídos e validados em populações de outras faixas etárias e aplicados em qualquer grupo populacional.

Dada a multidimensionalidade do constructo Qualidade de Vida na Velhice, em pesquisa recente, entrevistando 193 idosos da cidade de São Paulo, divididos em quatro grupos (A – doentes, de um ambulatório de Geriatria; B - saudáveis, pertencentes a grupos de terceira idade; C – doentes, com dificuldade de sair de casa; D - saudáveis, praticantes de atividade física regular), foram definidas oito dimensões extremamente relevantes para a qualidade de vida de idosos. São elas: Saúde Física, Capacidade Funcional/Autonomia, Psicológica, Social/Família, Econômica, Espiritualidade/Transcendência, Hábitos/Estilos de Vida e Meio Ambiente (Paschoal, 2004).

Devido às peculiaridades do envelhecimento e, em particular, da situação da velhice no Brasil, aliadas ao restrito número de instrumentos específicos para essa população, há necessidade de se construir um instrumento de avaliação de qualidade de vida de idosos brasileiros, instrumento que reflita seus anseios, desejos, expectativas, necessidades, medos, valores e princípios.

Realizar tarefa tão importante significa superar todas as dificuldades de um país em desenvolvimento, que tem problemas estruturais, organizacionais e políticos de monta e que, até três décadas atrás, se dizia “país de jovens”, mas que sofreu, nessas mesmas três décadas, um envelhecimento populacional rápido.

Cidade e qualidade de vida

Nossa busca de endeusamento e imortalidade se reflete na babel ou confusão reinante em nossas cidades
Frei Betto
Se considerarmos que o ser humano surgiu há cerca de 200 mil anos, a cidade é uma invenção relativamente recente. Durante milênios nossos ancestrais viveram como nômades coletores e, aos poucos, as técnicas de reprodução dos alimentos os fixaram como agricultores e pecuaristas. Havia, naquele longo período – como ainda hoje nas comunidades indígenas tribalizadas – relação direta, e até venerável, entre o ser humano e a natureza. Nossos antepassados se alimentavam sem alterar ecossistemas, biomas, biodiversidade.
Essa relação se altera com o advento das cidades. E um dos relatos mais significativos de como isso ocorreu é o episódio bíblico da Torre de Babel (Gênesis 11, 1-9), joia literária em menos de dez versículos.
Babel é semantema de Babilônia. Deriva da raiz hebraica “bil”, que significa “confundir”. Narra o texto bíblico que Javé, ao observar Babel, convenceu-se de que os humanos se fechavam em seus próprios e ambiciosos projetos, deixando de acolher os desígnios divinos. “Isso é o começo de suas iniciativas!” – disse o Senhor. “Agora nenhum projeto será irrealizável para eles.”
Segundo o autor bíblico, após o Dilúvio “todos se serviam da mesma língua e das mesmas palavras.” Não havia diversidade de enfoques e opiniões. O ponto de vista de um – o cacique, o chefe do clã, enfim, o poderoso -, era o ponto de vista de todos. E a atividade agropastoril igualava as pessoas.
A invenção do tijolo e da argamassa provoca um movimento migratório do campo para a urbe. Os humanos decidem “construir uma cidade” – Babel.
O versículo 4 registra as propostas de construção da cidade e da torre, e destaca o principal motivo de tal empreitada: “Para ficarmos famosos e não nos dispersarmos pela face da Terra.” Não se tratava de obter felicidade, bem-estar, bênçãos divinas. Importava a fama, possuir um nome sobreposto aos demais, e permanecer segregado, seguro.
A revolução tecnológica representada pelo tijolo (insuperado até hoje) imprime aos humanos a consciência de que não estão mais condicionados pela natureza. A relação se inverte. Agora é o ser humano que condiciona a natureza. Transforma-a em artefato.
Desprendido do ciclo da natureza, o ser humano já não funda sua identidade nos vínculos comunitários da sociedade agrária. Sua consciência se personaliza, ele se torna senhor do próprio destino, livre das mutações ecológicas que antes criavam nele a sensação de fatalidade e de temporalidade cíclica.
Tais avanços enchem os humanos de orgulho. Não satisfeitos de “construir a cidade”, decidem abrir a “porta do deus”, ou seja, erguer “uma torre cujo ápice penetre nos céus”. Aqui o relato expressa duas ambições: a de edificar uma montanha artificial (a torre), repositório da divindade, e a de “penetrar nos céus”, quebrar o limite entre o humano e o divino, o profano e o sagrado, a Terra e o Céu. Já não é a divindade que desce à Terra, é o ser humano que invade o Céu, graças à obra de suas mãos.
Antes que a soberba humana se inflasse ainda mais, Javé confundiu a linguagem dos habitantes de Babel e os dispersou. “Eles cessaram de construir a cidade.” Portanto, Babel não foi maldição. Foi dádiva. Delimitou a ambição humana e revelou ser obra de Deus a diversidade de pontos de vista e opiniões, contrária à identificação entre autoridade e verdade.
Toda essa sabedoria explica a arrogância decorrente, ainda hoje, de avanços científicos e tecnológicos. Queremos ser deuses. Nossa busca de endeusamento e imortalidade se reflete na babel ou confusão reinante em nossas cidades. Não pensamos no comunitário ou coletivo, pensamos no individual e no lucrativo.
Assim, nos gabamos de que o Brasil vendeu, em 2010, mais de 3 milhões de veículos automotores, embora isso agrave a congestão metropolitana, a poluição, os acidentes, pela impossibilidade de fiscalizar tantos veículos e abrir tantos espaços urbanos para que se locomovam e estacionem. Não se investe o suficiente em transportes coletivos, assim como não se planeja o espaço urbano, alvo de especulação imobiliária e vulnerável a fenômenos climáticos decorrentes de desequilíbrios ambientais, o que causa enchentes, desabamentos e secas prolongadas.
Hoje em dia, ganha cada vez mais espaço a proposta de bem viver dos povos indígenas andinos, conhecida como sumak kawsay. Sumak significa plenitude e kawsay viver. Não se trata de viver melhor ou viver cercado de conforto. Trata-se de viver em plenitude.
Plenitude implica fazer da felicidade um projeto comunitário, coletivo. É saber construir relações de solidariedade, não de competição; de harmonia, não de hostilidade; e estabelecer com a natureza vínculos de parceria cuidadosa.
Para a sociedade capitalista, a natureza é objeto de propriedade e temos o direito de explorá-la e até destruí-la em função de nossas ambições. O capitalismo se norteia pelo paradigma riqueza-pobreza, enquanto o sumak kawsay rompe esse dualismo para introduzir a de sociabilidade e de sustentabilidade, bases fundamentais de um projeto civilizatório. Fora disso, caminharemos para a barbárie.
Frei Betto é escritor, autor, com Marcelo Barros, de “O amor fecunda o Universo (ecologia e espiritualidade” (Agir), entre outros livros.

quinta-feira, 6 de outubro de 2011

NOVA TECNOLOGIA DE COMBATE À DENGUE

Uma tecnologia de combate à dengue desenvolvida pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) reduziu em 50% os casos da doença em 20 municípios mineiros onde foi implementada. A UFMG fez o levantamento com base em dados oficiais do Estado, que patrocinou a adoção do sistema em 2009 nessas cidades. Minas viveu em 2010 a sua mais grave epidemia de dengue, com 250 mil casos.

Responsável pelo desenvolvimento da tecnologia, batizada de MI-Dengue, Álvaro Eiras, do Departamento de Parasitologia (ICB) da UFMG, explica que o sistema usa uma espécie de arapuca para gerar dados de localização do mosquito, informando quais áreas devem ser priorizadas no controle.

Segundo ele, a ação começa com a instalação de armadilhas georreferenciadas via GPS nas áreas a serem monitoradas. Conhecidas como MosquiTrap, as "arapucas de mosquito" capturam as fêmeas adultas do inseto, impedindo que elas depositem seus ovos. A atração ocorre por meio de um líquido desenvolvido a partir do capim fermentado.

"Os próprios agentes conseguem identificar os mosquitos e enviar os dados para a central", diz Eiras. A central de processamento gera tabelas, mapas de infestação e índices entomológicos. No modelo convencional, os técnicos precisam visitar milhares de casas em busca de larvas, que ainda precisam ser analisadas em laboratório.

Eiras calcula que, para cada real investido em prevenção com a tecnologia, é gerada uma economia de R$ 11 - levando-se em conta assistência médica e perda de produção que cada caso de dengue provoca. Segundo ele, essa economia pode ultrapassar R$ 30 milhões nos 20 municípios analisados. Desde 2005, o dispositivo foi implantado em mais de 50 cidades brasileiras.

Postagens populares